domingo, 21 de novembro de 2010

Fogo

Nem toda boca fala
ou se cala
Entre os dentes e o porém
há omissão,
do fato;
retrato
da inconstância,
do prato
sem feijão
Nem toda boca sorri 
ou separa
a língua do pulmão;
o sorriso que respira o tempo
que cada um conta,
ou não
Dez dedos, dez minutos, 
uma mão
rumo ao futuro de outra mão
Todo o conjunto
é junto
assim por ter calor
Toda imagem é o reflexo da alma,
toda alma é o reflexo do amor

Iara Moura

terça-feira, 29 de junho de 2010

Saudade

Chega o silêncio 
tonto, manso, frio
deslizando 
em mãos, móveis, casacos.
A imagem 
opaca, clara, ardente
do retrato
remete,
em dois passos;
um pro ontem e outro pro lado,
a lembrança
grande, boa e risonha
do passado,
falado,
que como vapor
ralo, quente, molhado
se dissipa perante a realidade
pequena, lenta e fechada,
calada.
No sofá 
esverdeado, macio, fundo
me encolho
aperto, penso, escuto
o tal silêncio
de tão mudo 
gritar-me ao peito,
enlouquecendo, angustiando, trazendo
o sentir                              que fica
quando o amor            se vai .   
 
Iara Moura

quinta-feira, 22 de abril de 2010

Urgência

Penso como a noite é bela 
E o céu é morno.
Caio em mim como uma luva.
O medo me cabe como um novo suéter;
A coragem, como uma camiseta P, 
Mal me serve.
Se ontem o silêncio dizia por mim,
Hoje grito 
Coisa qualquer que se faça entender;
Que se faça assustar.
Da boca saem linhas, agulhas, panos.
E confecciono as palavras;
Entorpeço-as pelo sono.
Enjeto sonhos nas fibras de seus lenços costurados. 
Sopro a vida em roupa de dizeres
Aos seus ouvidos
Pra que desçam pra dentro de seu peito -
E como se pudessem rir 
De tudo o que se julgou, 
Se forçam a recordar do embalo. E vão. 
Vão.
Voam .
E   c
      a
      e
      m .
Olhando para o céu
Pela brecha da janela ,
Me sinto pronta.
Para dormir.

                                          Não se pergunte o que acontece.
                                                Faça acontecer por nós. 

 Iara Moura

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

Metamorfosear




Uma força quente faz-se abandonar
e um sentimento gélido,
- sensação morna e de tão calma,

apavorantemente fria -

se torna fato : sou abrigo de mil palhaços.

Desvairados, debochados dançarinos;

os verá , se ver o brilho de meus olhos.

Eles me falam , em mim e por mim,

enquanto eu me deixo ir sem nada dizer.

Raro , se não se vê palhaços

estou então de joelhos.

Na maioria dos sóis.

Na maioria das luas..

Me ponho de pé para o espetáculo da vida.

Mas quando, não menos que de repente,

tropeço entre os palcos do coração , me arrasto.

Arrasto .

R a s t e j o .

Meus olhos pretos e pretos sem palhaços.

Meus joelhos vermelhos e vermelhos de sangue,

esfolados.

Um pressentimento: nada mudará,

ainda.


Iara Moura

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

Devaneio

Flagrada, atônita,
em meio aos pensamentos  que voam pela órbita de meu sistema nervoso,
dei-me conta do quanto nada sei.
Pegando carona na próxima chuva,
o barulho latejante de cada gota
ensinaria, fatalmente,
a dor de ser o que é.
Sem fome alguma percebo que uma maçã cortada ao meio
vale mais que do pão uma meia fatia.
Você ao meio dia:
Meu almoço.
Mas claro; não me satisfaria.
Tenho sede de cor. Tenho sede de alma. 
Depois de provado o azul claro do céu, o êxtase vem quando se bebe 
o amor negro da tempestade.
Não há ânimo, nem cansaço,
só uma paralisia de sentidos 
durante um estado enigmático  
que já se perdurou por toda uma vida;
não há entendimento algum entre as contas de física
e meu raciocínio do universo.
Fisicamente sou mesmo assim;
magra a ponto de me descair por entre a brecha da porta e o chão,
e me libertar.
Alguém já percebeu o quanto há,
entre um ser gentil, viril,
de força humana,
e o luar?


Iara Moura

segunda-feira, 28 de setembro de 2009

Mulheres são de Vênus





Em um planeta aonde as horas
escorrem por entre os ponteiros,
os minutos se apressam em meio aos segundos,
que escapam rápido por entre os números -
lá está ela. 
Sem alvoroços
ou estampas de sorrisos
ao longo do vestido.
E falta relógio no tempo
que descompassa em seu peito;
a indecisão se instala no âmago interior,
ao passo que o corpo se esvai. 
Desejo de ir e não voltar.
Desejo de ter para onde ir
 e de se esquecer como voltar.

 
Não adianta fugir .
É impossível fugir ..
de si mesmo. 


Iara Moura